segunda-feira, janeiro 18, 2021

Yes Minister (2-3-4-5-6-7-8)



 Sim, Senhor Ministro (2)

Ministro dos Assuntos Administrativos, Jim Hacker [recém-chegado ao ministério] - Quem há mais no nosso departamento?
Sir Humphrey Appleby - Eu sou o subsecretário de Estado permanente, o [Bernard] Woolley é o seu secretário particular principal. Eu tenho um secretário particular principal, que é secretário particular do secretário permanente. Há dez secretários delegados responsáveis perante mim, e 87 secretários e 219 secretários adjuntos que respondem perante os secretários particulares principais. O primeiro-ministro vai nomear dois subsecretários parlamentares e o senhor nomeará o seu secretário particular parlamentar.
Ministro - E sabem todos escrever à máquina?
Sir Humphrey - Nenhum de nós sabe. Quem faz isso é Mrs. McKay. É a secretária.

Sim, Senhor Ministro (3)
Ministro dos Assuntos Administrativos, Jim Hacker - Este ministério tem de eliminar muita burocracia. Vamos dar aqui uma vassourada, abrir as janelas para entrar ar, pôr esta máquina obsoleta em ordem.
Sir Humphrey Appleby - Uma limpeza, quer dizer?
Ministro [sentado à secretária] - Isso mesmo. Há demasiada gente sentada à secretária
Sir Humphrey - ...
Ministro - Não me refiro a nós. Temos de correr com aqueles que só estão a fazer número!
Bernard Woolley, secretário particular do ministro - Correr com eles?
Sir Humphrey - Redistribuí-los, quer o senhor dizer.
Ministro - Sim, sim. Quero pô-los a trabalhar. Somos adeptos de um Executivo aberto: é nisto que o meu partido acredita e que serviu de base ao nosso manifesto eleitoral. Temos de abrir a política ao País. Que tal?
Sir Humphrey [segurando uma pasta com papéis] - Veja estas propostas. Esboçam a implementação dessa política e contêm a base para um Livro Branco, que a meu ver deverá chamar-se Governo Aberto.
Ministro - Então já foi tudo...
Sir Humphrey - Já foi tudo tratado.
Ministro - Quem preparou tudo isto?
Sir Humphrey - A máquina burocrática obsoleta.

Sim, Senhor Ministro (4)
Ministro dos Assuntos Administrativos, Jim Hacker - Quando é que trato desta correspondência toda?
Bernard Woolley, secretário particular do ministro - Não é obrigado a isso.
Ministro - Não sou?
Bernard - Se não quiser, não. Podemos elaborar uma resposta oficial.
Ministro - E essa resposta diz o quê?
Bernard - Diz: "O ministro pediu-nos para agradecer a sua carta." E acrescentamos: "O assunto está a ser considerado." Ou, em alternativa, especificamos que "o assunto está a ser seriamente considerado."
Ministro - Qual é a diferença?
Bernard - "A ser considerado" significa que perdemos o dossiê. "A ser seriamente considerado" significa que andamos à procura dele... Basta passar as cartas do cesto de Entrada para o de Saída, acrescentando uma nota se quiser ver a resposta. Se não quiser, não voltará a ser maçado com este assunto.
Ministro - Quer dizer que se eu as transferir daqui para ali, mesmo sem ler, não preciso de fazer mais nada?
Bernard - Sim.
Ministro - E tratam disso?
Bernard - Precisamente.
Ministro - Tratam de tudo como deve ser?
Bernard - Imaculadamente.
Ministro - Então para que serve aqui um ministro?
Bernard - [Muito hesitante] ... Para tomar decisões políticas. Decide e nós executamos.
Ministro - E quando é que essas decisões são necessárias?
Bernard - De vez em quando...
Ministro - [Indignado] Este Governo veio para governar! Não veio só para fazer de conta que governa, como o Governo anterior. Quando um país vai por aí abaixo chega um momento em que é preciso alguém tomar conta do volante e carregar no acelerador.
Bernard - Julgo que quer referir-se ao travão, senhor ministro.

Sim, Senhor Ministro (5)
Sir Humphrey Appleby - Bernard, você sabe muito bem que tem de haver uma forma de medir o êxito da administração pública. A British Leyland mede o êxito pela dimensão dos lucros ou, melhor dizendo, mede o falhanço pela dimensão dos prejuízos. Mas nós, na função pública, não temos lucros nem prejuízos. Temos de medir o êxito pela dimensão do nosso pessoal e pelo volume do nosso orçamento. Um organismo grande tem mais êxito do que um pequeno.
Bernard Woolley - Isso quer dizer que o responsável pela Autoridade Regional do Nordeste agiu mal ao economizar tanto?
Sir Humphrey - Claro que sim. Ninguém lhe pediu para fazer isso. Já pensou se todos fizéssemos o mesmo? Se todos começássemos irresponsavelmente a poupar dinheiro público?
Bernard - Mas é isso que o ministro quer...
Sir Humphrey - Os ministros vêm e vão. Duram em média menos de onze meses em funções. O nosso dever é ajudar o ministro bater-se por mais dinheiro para o ministério, por maior que seja a reacção de pânico que isso lhe provoque.
Bernard - E não o ajudamos a superar o pânico?
Sir Humphrey - Não, não. Ele que fique em pânico. Os políticos apreciam isso, o pânico fá-los sentir activos. Serve-lhes como sucedâneo das concretizações. Só temos de nos certificar de que isso não altera nada.
Bernard - Mas são representantes do povo, democraticamente escolhidos...
Sir Humphrey - Os deputados são escolhidos pelas secções locais dos partidos: 35 homens de gabardina ou 35 mulheres com chapéus ridiculos.
Bernard - Mas o Governo é escolhido de entre os melhores deles...
Sir Humphrey - Bernard, só há 630 deputados. Basta um pouco mais de trezentos para formar governo. Desses trezentos, cem são demasiado velhos e demasiado tontos. Outros cem são demasiado jovens. Sobram cem deputados para preencher cem postos governamentais. Não há escolha. Não houve selecção nem preparação. Temos de ser nós, na administração pública, a fazer o trabalho deles.

Sim, Senhor Ministro (6)
Ministro dos Assuntos Administrativos, Jim Hacker - Dá-me uma resposta directa a uma pergunta directa?
Sir Humphrey Appleby - Com todo o prazer, desde que não me peça que caia em generalizações grosseiras e simplificações excessivas, como sim ou não..
Ministro - Isso é um sim?
Sir Humphrey - ... Sim.
Ministro - Cá vai então a pergunta directa.
Sir Humphrey - Pensei que já a tinha feito.
Ministro - Vai apoiar ou não a minha tese de que existem funcionários públicos em excesso?
Sir Humphrey - Se me pede uma resposta directa direi que, tanto quanto é possível verificar, respondendo por ordem, e tomando a média dos departamentos, talvez, em última análise, seja provavelmente verdade dizer que, em termos gerais, se descobriria, sem forçar, que provavelmente nenhum dos aspectos em consideração tem peso excessivo. Tanto quanto se pode presumir, nesta fase.

Sim, Senhor Ministro (7)
Sir Humphrey Appleby - Bernard, o ministro ainda não veio?
Bernard Woolley - Não. Está em reunião, no gabinete.
Sir Humphrey - Que reunião é essa?
Bernard - Nada de especial.
Sir Humphrey - Estou a ver... E que reunião foi aquela de ontem?
Bernard - O ministro esteve a rever as respostas que dará às perguntas que lhe chegam do Parlamento.
Sir Humphrey - Mas nessa reunião estiveram secretários-adjuntos e outros subalternos.
Bernard - Só aqueles que lhe fornecem informações.
Sir Humphrey - Bernard, isso tem que acabar já!
Bernard - Porquê?
Sir Humphrey - Acha que o ministro deve começar a dirigir o ministério?!
Bernard - Sim. Por acaso nessa matéria as coisas até estão a correr bastante bem.
Sir Humphrey - Não, Bernard. Quando um ministro começa a dirigir o ministério as coisas não correm nada bem. Pelo contrário, começam a correr mal.
Bernard - Mas não cabe ao ministro dirigir o ministério?
Sir Humphrey - Não. Essa é a nossa função. Ou melhor: é a minha função após 25 anos de experiência na administração pública. Já imaginou o que aconteceria aqui se deixássemos de ser nós a dirigir o ministério?
Bernard - Não. O que é que aconteceria?
Sir Humphrey - Para começar, instalava-se o caos. Depois acontecia algo muito mais grave: haveria inovações, mudanças, discussão pública.
Bernard - Mas o que deve ele fazer então?
Sir Humphrey - Bernard, um ministro tem três funções. Primeira: tornar os nossos actos plausíveis aos olhos do público e do Parlamento - ele é o homem encarregado das relações públicas. Segunda: é o nosso homem no Parlamento, encarregado de fazer passar a nossa legislação. Terceiro: é o nosso ganha-pão - tem de bater-se no Governo pelo dinheiro necessário para fazermos frente às despesas que temos no ministério. O que ele não tem é de reunir-se com secretários-adjuntos!
Bernard - Mas se ele tem tempo disponível...
Sir Humphrey - Se tem, não devia. A culpa é sua: você tem de conseguir que ele não disponha de tempo. Preencha-lhe a agenda: ele devia fazer discursos, fazer visitas, viajar ao estrangeiro, enfrentar crises, emergências, momentos de pânico. Você permite que ele disponha de tempo livre!
Bernard - Ele é que consegue...
Sir Humphrey - Insista em preencher-lhe a agenda.
Bernard - Ele não me deixa.
Sir Humphrey - Não lhe pergunte: faça! Obrigue-o a passar mais tempo num local onde não possa estorvar-nos.
Bernard - Mas onde?
Sir Humphrey - Na Câmara dos Comuns, por exemplo.


Sim, Senhor Ministro (8)
Sir Humphrey Appleby - Bernard, os ministros nunca devem saber mais do que é necessário. Assim não podem dizer nada a ninguém. Tal como os agentes secretos, também eles podem ser capturados e torturados.
Bernard Woolley, secretário particular do ministro - Por terroristas?
Sir Humphrey Appleby - Pela BBC.

Yes Minister (1)

 




Sim, Senhor Ministro (1)

Sir Humphrey Appleby - Bruxelas vai introduzir um bilhete de identidade europeu, para uso de todos os cidadãos da CEE. O Ministério dos Negócios Estrangeiros vai aceitar para poder negociar a montanha de manteiga, o lago de vinho, o oceano de leite, a guerra do carneiro e o cheirete a bacalhau. O primeiro-ministro, como é lógico, quer que seja o senhor a apresentar [aos ingleses] a nova legislação.
Ministro dos Assuntos Administrativos, Jim Hacker - Eu?!
Sir Humphrey - Sim. O senhor é conhecido como pró-europeu e, a longo prazo, esta legislação poderá ser benéfica para a nossa administração.
Ministro - Boa ideia, não acham?
Frank Weisel, conselheiro político - Boa ideia?!!
Ministro - Boa ideia?!!
Sir Humphrey - Não é boa ideia?
Frank - É um suicídio político!
Ministro - Obrigar os ingleses a usar um documento de identificação! Vão dizer que estou a introduzir um estado policial. Foi para isto que combatemos em duas guerras mundiais?!
Sir Humphrey - Vendo bem, ministro, isto é pouco mais do que uma carta de condução.
Ministro - É o último prego no meu caixão!
Frank - Porque não tratam os Negócios Estrangeiros disto?
Sir Humphrey - Foi essa a sugestão inicial do primeiro-ministro. Mas os Estrangeiros disseram que era questão para o Interior. E o Interior disse que se tratava de um assunto administrativo e o primeiro-ministro acabou por concordar.
Frank - Andam todos a passar a batata quente!
Ministro - Não admira, se vai explodir.
Sir Humphrey - Receio que esta venha a ser a último acção deste departamento: um excelente cavalo de batalha para os eurocépticos.
Ministro - Os Estrangeiros não vêem o mal que isto vai causar ao ideal europeu?
Sir Humphrey - Claro que vêem. Por isso mesmo é que procedem desta maneira.
Ministro - Os Negócios Estrangeiros não são pró-europeus?!
Sir Humphrey - Sim e não... se me permite a expressão. São pró-europeus porque, no fundo, são anti-europeus. A nossa administração pública sempre fez tudo para que o Mercado Comum [europeu] não funcionasse. Por isso entrámos nele.
Ministro - De que é que você está a falar?!
Sir Humphrey - Senhor ministro, há pelo menos 500 anos que a Inglaterra tem a mesma política no plano internacional: criar uma Europa desunida. Por isso nos aliámos aos holandeses contra os espanhóis, aos alemães contra os franceses, aos franceses contra os alemães e os italianos. Dividir para reinar. Porque haveríamos de alterá-la agora se tem resultado tão bem?
Ministro - Isso é história antiga!
Sir Humphrey - Isto é gestão corrente. Para destruir tudo tínhamos que entrar para lá. Tentámos destruir de fora, mas não resultou. Agora que estamos dentro podemos transformar aquilo numa bagunça. Pôr alemães contra franceses, franceses contra italianos, italianos contra holandeses. Os Negócios Estrangeiros estão satisfeitíssimos. É como nos velhos tempos.
Ministro - Mas estamos empenhados no ideal europeu...
Sir Humphrey - [Ri-se]
Ministro - Então porque é que apoiamos a entrada de novos Estados-membros?
Sir Humphrey - Pela mesma razão. É como na ONU. Quantos mais países tiver, mais zaragatas haverá, mais inútil se torna.
Ministro - Que cinismo terrível!
Sir Humphrey - Nós chamamos-lhe diplomacia, senhor ministro.